Vez ou outra eu penso nela... Mas nunca deixei de sonhar...

Sabe-se que um gato tem coração igual a qualquer ser humano, não digo o coração no peito e sim na alma. Miau.
Poderia eu nesta crônica contar uma história sobre muita coisa que este gato aqui viveu depois de ter morrido e ressuscitado num período que dava, sem dúvida nenhuma, pra eu ter ganhado minhas sete vidas de volta. Mas não é bem assim. Não vou discorrer sobre o paraíso em que na morte do corpo minha alma foi morar, terei muito tempo para isso. Poderia também falar de coisas que eu vi no céu, sentimentos e sensações que de tão reais pareciam que eu estava sonhando acordado. (mas eu não estava dormindo mais do que o sono eterno!). Minha cabecinha de felino ainda, mesmo de volta à Terra, ferve com tanta emoção vivida em minha morte. No entanto vou falar de um anjo, ou melhor, uma santa.
No céu em que eu voava vi muita gente, muito anjo bom (e caído também vi muitos), aprendi a entender que amor não é coisa de sentimento e sim de ação. Com isso cheguei a acreditar que a poesia havia acabado no mundo. Vou deixar a outra hora escrever sobre tudo em poucas doses...
Voltarei à santa, àquela que eu falava antes...
Naquele céu azul de vales e montanhas lindas, depois de voar muito tempo e muito alto, resolvi descer na terra do paraíso, onde existem muitas pessoas e seres de Deus convivendo em harmonia perfeita. Desci para recuperar a força de minhas novas e lindas asas brancas. Sim! Eu tinha asas iguais de anjo no céu, eu voava! E nesta descida conheci uma menina de olhos bem intensos e sorriso tão doce que me perdia olhando para ela, mas naquela hora eu não podia me dar ao luxo de me encantar por ninguém e muito menos encontrar algo que meu coração fechado a sentimentos não estava buscando. Eu precisava mesmo era encontrar forças para voar novamente e percebi que nesta menina estava o começo de algo grande que buscava em mim, em meu dolorido e machucado coração.
Começamos a conversar profundamente sobre a vida, sobre o passado antes de minha morte na Terra. Eu falava de mim e ela um pouco dela mesma. Não conseguia entender porque a voz dela me encantava, não conseguia entender porque eu estava falando tanto de minha vida naquele momento com ela. E ela me ouvia, me entendia. Na real, foi a primeira vez que no céu eu senti meus bigodes de gato vira-lata arrepiarem, dava vontade de ronronar.
Ele falava diferente das pessoas daquele lado do céu que tive a impressão de que ela era estrangeira. Eu precisava voar novamente, mas não conseguia sair do lado dela. E isso me deixou muito intrigado e desconfiado dela (que ela era?) e de mim mesmo.
Comecei a entender que ela não era um anjo e nem um ser humano comum, eu nunca na Terra havia visto alguém como ela falar sobre tudo e com o coração tão sereno e aberto.
Aí este gatinho aqui viajou em si mesmo, felino bobo que se rende fácil a passadas de mão na cabeça. Foi muito bom. Pela primeira vez, em toda a minha existência, fui realmente sincero. E ela sorria leve, linda e tímida.
Bom para parar de enrolar, vou dizer uma coisa curta: me encantei como nunca na vida. Nenhuma fada, mesmo tentando, conseguiu me encantar como ela o fez sem querer. E este “sem querer” me deixou triste antes de voar, pois qualquer coisa que eu dissesse poderia parecer carência minha e não era.
Ela me contou que durante muito tempo se escondeu de si mesma, camuflava aquele maravilhoso olhar e evitava aquele mágico sorriso por uma razão muito simples que ataca todos os seres humanos, gatos e outros serem que amam e sentem dor: ela não gostava muito de ser como ela o era.
Aí tocou no ponto forte em que este gato aqui entende. Pois não gostar de si mesmo foi o que fez com que numa noite fria de agosto eu fosse atropelado por um caminhão e morresse gritando naquele asfalto gelado. Ela falava e eu lembrava de meus últimos suspiros desconsolados no chão, abandonado e com medo. Revivi minha morte naquele sorriso lindo. Mas não foi de uma forma dolorida e sim contemplativa de mim mesmo através das idéias dela. Me fazia bem saber que eu nunca estive abandonado no mundo como pensava antes. Me fazia bem estar com ela. Por momentos deixei de pensar no que tinha ido buscar lá e só ficava olhando seu sorriso, criando poesias em minha mente com aquele olhar e dilatando minha alma ao som de sua voz.
Vieram em minha cabeça felina algumas perguntas: será que ela também tinha morrido atropelada? Será que ela se sentiu abandonada um dia?
Foi aí que ela me mostrou quem ela era, mesmo sem querer que eu percebesse. Ela não havia morrido e sim foi levada aos céus pelos anjos. Nesta viagem, ela aprendeu a se gostar, deixou de esconder seu olhar negro e profundo e se encontrou com Nossa Senhora no paraíso.
Meu coração disparou e vi que estava eu, simples gatinho de telhado, na presença de uma santa. Ela negava que isso fosse verdade justificando que nunca no mundo poderia haver uma santa ainda em vida, mesmo estando na terra do paraíso. Disso eu já tinha ouvido falar, só que não havia duvidas de que estava em minha frente e sorrindo para mim uma santa de verdade. E ainda assim eu não queria acreditar no que estava compreendendo ali naquela face resplandecente de um sorriso simples e cativante. Logo eu, que já estive com fadas, anjos, reis e rainhas. Nunca havia conhecido uma santa pessoalmente. Meu coração gelou, tentei me afastar, mas a santidade dela me atraía muito e então resolvi voar para bem longe. Já era hora de eu ir embora e minhas asas estavam fortes novamente.
Soube depois que ela voou para um lugar bem longe lá no sul... Aprendi a rezar só para rezar por ela e, se eu mentir aqui digo que vez ou outra eu penso nela... Porque se eu falar a verdade nestas últimas linhas vou parecer um siamês encantado e apaixonado por alguém inatingível... Mas nunca deixei de sonhar...


GATO LARANJA
03-11-2009

Um comentário:

Ver a luz se há disse...

Obrigada pelo retorno, Gato.
Me encanto pelo que vc escreve meu grande e velho amigo felino.
Voce teve o privilegio de conhecer seres magicos e misticos, e eh esse poder de ver o maravilhoso por entre as cascas mortais. Ver a beleza de almas puras entre as vestes mundanas que me comove sempre.
Fico feliz pelas suas sete vidas. E por ter participado mesmo que a distancia de pelo menos uma delas, aquela em que voce era um fofo e feliz filhote de gato.
Um gato musico.
Um gato alegre.
Um gatinho preguicoso.
Que sentava proximo de mim na carteira da frente e que um dia roubou minha agenda e nao sossegou ateh eu ensinar meu codigo secreto. Confesso que minha desconfianca natural de animal arredio (que nao sou mais) ensinei todas as letras erradas.
Acho que por despeito, aquele gato gordinho palido e de pelos cacheados escreveu "suck my fuck in dick" Nao lembro se eh isso, to na faculdade e nao em casa. KKKKKKKKK
Tenho ateh hj a agenda!!!!
Um dia, quando estiver em Cerquilho, venha tomar um pires de leite na minha casa, conhecer minha familia, meus filhotinhos.

Peco desculpas pela ortografia, meu amigo, mas o teclado que estou nao tem acentos configurados.

Saudds de comentar suas cronicas